Volta e meia surge um ator que, fora do circuitão hollywoodiano, alia um talento absurdo a ótimas escolhas de carreira para se tornar um nome quente no cinema e entrar na minha lista de favoritos. Foi assim com Tony Leung e Joseph Gordon-Levitt, por exemplo. O caso mais recente, contudo, é o de Mads Mikkelsen.
Nascido na Dinamarca, Mikkelsen já tinha chamado atenção em ótimos filmes dos também nórdicos Nicolas Winding Refn e Susanne Bier. Em Hollywood, teve a honra de fazer o primeiro vilão da série 007 com Daniel Craig - e quem viu a cena da tortura de James Bond em CASSINO ROYALE sabe do que o cara é capaz. No fraco FÚRIA DE TITÃS, em meio a um elenco no automático, Mikkelsen parecia estar em um filme muito melhor devido à qualidade de sua atuação.
Recentemente, assisti a duas excelentes obras em que Mads Mikkelsen mostra não só sua versatilidade mas também o ótimo faro para a escolha de papéis. A primeira é A CAÇA, excelente drama opressivo de Thomas Vinterberg, e O AMANTE DA RAINHA, filme histórico que foi indicado ao Oscar de filme estrangeiro esse ano.
A CAÇA conta a história de um professor de uma creche (Mikkelsen) que cai numa espiral de desgraça quando uma criança afirma ter visto o "pipi" dele - está evidente o abuso sexual. A partir de uma sutil porém notável reflexão sobre uma fé nórdica na honestidade dos indivíduos (especialmente crianças), A CAÇA denota como a culpa de algo tão horrível só pode ser genuína. Afinal de contas, quem mentiria ou inventaria um dos crimes hediondos que pode existir? Vinterberg usa de metáforas interessantes para ilustrar a situação terrível em que se encontra o professor, da inabilidade de se pisar em rachaduras (uma espécie de TOC que a menininha acusadora tem) até a tradicional cultura de caça presente na Dinamarca. Mikkelsen representa de forma pungente a exclusão social (por vezes através da violência) a que o professor é submetido e a dor de ser visto como vilão por um uma comunidade mais vilanesca do que ele.