16 de agosto de 2012

iHate MADONNA TOP 10 VIDEOS

Para comemorar o aniversário da Rainha do Pop esse mês, aqui vai minha lista dos 10 melhores clipes da carreira dela.
10- Bad Girl (Dir.: David Fincher)
 
 
David Fincher foi o diretor que melhor captou o status de megastar de Madonna e usou isso como força criativa na realização de videoclipes. No caso, de "Bad Girl", temos uma historinha que muito bem poderia ter se tornado depois um longa-metragem bem ao estilo do cineasta de SEVEN. É um dos poucos clipes (único?) em que Madonna, mesmo que vivendo uma personagem, se dá mal devido à sua posição de poder (sexual, social e econômico). Se bem que terminar o clipe ao lado de Christopher Walken, no papel de Anjo da Morte, não é nada mal...
9- Express Yourself (Dir.: David Fincher)



O clipe de Express Yourself (considerado pela Slant o melhor de todos os tempos), traz Fincher no seu ápice criativo. Um dos clipes mais caros do seu tempo (1 milhão de dólares em 1990), Express Yourself é uma versão pós-feminista do METROPOLIS de Fritz Lang. Do alto da torre mais alta da cidade, rodeada de arranha-céus e pistões que são verdadeiros símbolos fálicos, Madonna canta sobre auto-afirmação da mulher enquanto vive aprisionada por um magnata e observa operários saradões trabalharem lá embaixo. Os movimentos de câmera, sempre de cima para baixo, são um toque de mestre. O clipe brinca com as fronteiras dos gêneros e do sexo como instrumento do poder, um dos temas mais caro da videografia de Madonna. 
 
8- Justify My Love (Dir.: Jean-Baptiste Mondino)


O magnum opus sadomasô de Madonna. Pegando emprestado elementos do cinema francês dos anos 60 e especialmente do filme The Night Porter, o diretor Jean-Baptiste Mondino coloca Madonna no meio de um delírio onde o sexo é menos prazer e mais poder. Figuras andróginas, elementos religiosos  e muito couro preto são cortesia da casa, assim como o modelo Tony Ward. Permanece como um dos clipes mais emblemáticos de Madonna, não só por ser banido na MTV mas também por ser o 'video single' mais vendido da história. 
 
7- Bedtime Story (Dir.: Mark Romanek)

 
6- Rain (Dir.: Mark Romanek)

 
Novamente Mark Romanek, com seu estilo clean característico, filma um videoclipe sobre os bastidores de um videoclipe, colocando Ryuichi Sakamoto como o diretor do desse 'meta-video'. A pós-produção do clipe de Rain já se tornou lendária: o vídeo foi filmado em preto-e-branco para depois ser todo colorido digitalmente, o que explica os inacreditáveis olhos azuis de Madonna. Essa manipulação da imagem faz parte não só da forma quanto do conteúdo do clipe, que bem sutilmente aborda a superficialidade e a criação do mito no mundo contemporâneo.  
 
5- Frozen (Dir.: Chris Cunningham)


Chris Cunningham realmente parece ser o último nome que poderia se associar à Madonna, mas a parceria entre o rei dos vídeos 'dark' e a rainha do pop rendeu a pequena obra de arte que é o clipe de 'Frozen'. Uma Madonna mezzo gótica, mezzo indiana se contorce de formas múltiplas em meio a corvos e dobermans em pleno deserto. Foi o primeiro clipe do aclamado disco Ray of Light e a aposta arriscada de Madonna deu mais do que certo. Um vídeo que usa o conceito simples de performance, mas feito de maneira original e marcante. De quebra, ainda há a direção de fotografia de um dos meus DPs favoritos, Darius Khondji (SEVEN, EVITA). Coisa fina.  
 
4- Material Girl (Dir.: Mary Lambert)
 

Provavelmente o visual mais famoso de Madonna em videoclipe. A imagem da cantora como uma Marilyn pós-moderna a persegue até hoje. Irônico até o osso, o vídeo é a epítome do pensamento americano dos anos 80. Felizmente, a mensagem de "não se pode comprar o amor com presentes" não ficou na cabeça de ninguém - o que importa é o vestido rosa, os diamantes, e a idéia de que Madonna é o melhor produto de todos.  
 
3- Oh Father (Dir.: David Fincher)
 

O clipe mais mórbido de Madonna, e o mais visualmente rico de Fincher. Homenageando CIDADÃO KANE (o início do clipe é um releitura fantástica das primeiras cenas do filme de Orson Welles) e o expressionismo alemão, o diretor narra a história da morte da mãe da cantora e seu posterior embate com a figura do pai - que acaba se misturando às figuras do padre e também do amante.

A fotografia em p&b é uma das mais lindas da história do videoclipe, com suas sombras em movimento e a neve onipresente. As referências-cristãs, assinaturas da carreira de Madonna, se fazem presente de forma sinistra, como se a própria cantora fosse responsável pela morte de sua mãe. A cena dos lábios do cadáver costurados chocou muita gente na época, mas o final do clipe com a menina dançando no túmulo da mãe também é poeticamente aterradora.
 
 2- Vogue (Dir.: David Fincher)


"Vogue" é a obra-prima da parceria Fincher/Madonna. Apenas com cenas de estúdio, Fincher traduz a imagética da Hollywood dos tempos áureos na afirmação de Madonna como a nova diva que ultrapassa a linguagem do cinema através do videoclipe. Todo em art deco e com uma fotografia em preto e branco irretocável, o clipe re-atualiza a mitologia dos grandes nomes do cinema americano dos anos 30, 40 e 50 (Greta Garbo, Marlene Dietrich, James Dean, todos citados na letra da música) através do 'Vogue', na verdade um movimento de dança surgido no submundo negro e gay de Nova York. Ao juntar esses dois universos, Fincher e Madonna reconfiguram a iconografia clássica no qual o corpo de Madonna é o novo totem contemporâneo. Dessa forma, o Mainboucher Corset de Horst P. Horst e os quadros de Tamara de Lempicka são materializados em Madonna, assim como a cantora personifica todas as musas da Hollywood clássica.  
 
1- Like a Prayer (Dir.: Mary Lambert)
 

O vídeo começa num local desolado, inóspito até, onde se vê no canto esquerdo ao fundo fogo saindo de uma espécie de latão (já se anuncia o fogo que, literalmente e simbolicamente, será logo depois elemento central do clipe). Do outro canto da tela, uma figura de preto vem correndo do fundo aproximando-se do primeiro plano, enquanto um riff de guitarra em meio ao som de sirenes policiais vai se tornando audível. A figura de preto revela-se Madonna, que cai sobre a terra bem perto à câmera e revela uma face de dor. A imagem corta para uma porta se fechando e, em seguida, uma cruz queimando.
Imagens de Madonna se levantando do chão se alternam com cenas em câmera lenta de homens (brancos) mal-encarados atacando uma mulher, enquanto um outro homem (negro) caminha, com placidez sofrida, por um corredor escuro com o rosto iluminado. Voltamos para Madonna se levantando, que vê uma igreja com arquitetura típica do sul dos Estados Unidos e se encaminha em direção a ela.

Madonna entra na igreja, que apesar de ter velas acesas encontra-se absolutamente vazia, e encaminha-se diretamente para uma imagem (em tamanho real) de um santo negro, que está situada à direita do altar. A questão da identidade do santo nesse clipe é discutida. Vários acreditam se tratar do Santo Martin de Porres, um frei dominicano nascido no Peru conhecido por oferecer conforto aos pobres e escravos. Outros acreditam se tratar de uma versão negra de Jesus (o filho de Deus, não o peguete de Madonna), já que a posição da manta vermelha do santo é característica. Além do mais, depois de entrar em contato com a imagem religiosa, Madonna adquire stigmata, as feridas de Cristo causadas pela crucificação. Seja como for, é interessante a posição do santo nessa igreja, já que ele se encontra bem à direita do altar, num local periférico, longe de onde a maioria das imagens de santos mais importantes (e brancos?) estaria. A figura do santo negro, por si só, já causa estranhamento pela raridade. No entanto, são as feições bem humanas da imagem que causam uma sensação do bizarro e ao mesmo tempo do maravilhoso.

O refrão da música começaa e a estáua mexe vagarosamente os dedos. Em seguida, começa a verter lágrimas. Madonna então se ajoelha em frente à imagem e começa a cantar. É interessante notar que o santo encontra-se num imenso relicário, separado por grades, como que o proibindo da liberdade que é sabido que ele almeja.

Madonna se deita então em um banco de madeira e (através de sonho? ilusão? devaneio religioso?) é transportada para uma espécie de plano celeste, cercada por nuvens e vento nos cabelos. Nesse ambiente, encontra-se com uma mulher (negra) que a recebe sorridente para logo depois arremessá-la de volta à realidade. Só que quando a cantora volta ao ao mundo real, este já não é mais o mesmo.

Ela beija então os pés do santo para logo depois abrir a grade que o prende (pequeno erro do clipe, já que ela não poderia ter beijado o santo sem ter aberto as grades antes). Madonna acaricia o rosto da estátua, que comeca a se mover e adquire formas totalmente humanas, revelando-se como o mesmo homem que havia aparecido anteriormente no corredor escuro. Ele beija a cantora na testa e na face de forma altamente respeitosa e sai da igreja, com um imenso sinal de EXIT acima da porta. Um punhal chama a atenção de Madonna que, ao pegá-lo, fere as palmas das mãos de forma parecida com as chagas de Cristo. Teria Madonna cometido um pecado mortal ao libertar o santo? Seria ela crucificada por tal ato? Ou seria ela um messias pós-moderno, anunciando ao mundo a ética da sociedade do espetáculo, onde até mesmo a religião poderia ser consumida através de um videoclipe?

Em seguida, ela olha diretamente para a câmera (que agora está com uma lente que deixa a imagem levemente curvada) e diz "let the choir sing", e a câmera gira então para mostrar o altar que, ao invés de vazio como anteriormente, está tomado por um coral negro de adultos e criançaas, incluindo a mulher que Madonna tinha visto no plano celeste.

(Vale a pena abrir um parêntese aqui para a questão da apropriação da cultura negra feita por Madonna. Muita antes da massificação do hip-hop e da diluição da estéica negra americana até chegar ao ridículo, Madonna incluiu em seus clipes vários elementos das chamadas minorias. A cantora foi um dos primeiros nomes do mainstream a utilizar ritmos latinos (em La Isla Bonita) sem medo de ser confundida com world music, e muito antes de Livin La Vida Loca. Em Like a Prayer o uso do coro negro remete imediatamente à música gospel americana, tradicionalmente negra e oriunda do sul dos EUA. Tal apropriação de uma cultura tão específica para ser transformada pelo prisma pop foi criticada por muitos (Camille Paglia inclusive) e depois imitada por vários (exemplos mais recentes são Eminem com hip-hop e Christina Aguilera com o jazz). Essa inspiração (ou roubo) da estética das minorias chegaria ao cúmulo em Vogue, quando de uma tacada só Madonna se apropria das culturas gay, negra e latina vestindo-as com a roupagem da era de ouro de Hollywood.)

Enquanto o coro canta o refrão da música, são mostradas mais claramente as cenas da mulher sendo atacada por uma gangue e Madonna sendo a testemunha ocular do crime. Não fica claro o porque da mulher estar sendo atacada (seria ela violentada em seguida?), mas o mais importante é que um homem negro (o mesmo que faz o papel do santo) aparece para tentar salvar a vítima, que aparentemente já está morta. Os criminosos se escondem ao ver a polícia se aproximando. Vendo o homem negro ao lado do corpo da mulher ensaguentada, os policiais imediatamente o prendem. Pergunta importante: por que Madonna não faz nada? Por que ela não diz ao policial que viu o crime? Ela parece estar tentando voltar para o lugar de onde teria saído (parece um depósito, mas também uma igreja - talvez a mesma igreja do clipe, o que mudaria toda a interpretação da história). Estaria ela tentando fugir, ou buscar ajuda? Ela depois apenas vai embora, com cara de raiva.

Bem, tudo isso não importa porque em seguida somos extasiados (ou seria aturdidos?) por uma das imagens mais belamente chocantes da história do videoclipe e a mais icônica de toda a carreira da cantora: Madonna dança com as cruzes queimando ao fundo.

São cinco cruzes (três na frente e duas atrás) num campo verde irregular à noite. Com essa cena percebe-se o porquê de Madonna, geralmente acostumada com as madeixas loiras, decidiu pelo tom castanho escuro no clipe: não só o cabelo combina com a cor do vestido, mas também contrasta com o amarelo e laranja do fogo no background. As cruzes queimando remetem imediatamente à Ku Klux Klan e seu incentivo à discriminação aos negros. Que tipo de mensagem estaria Madonna tentando passar aqui? É curioso que essa cena venha imediatamente depois da prisão injusta de um homem negro inocente. As cruzes serviriam como purgação dos pecados de uma sociedade intolerante e preconceituosa, incapaz de separar os bons dos maus. Por outro lado, o fogo nas cruzes é o atestado simbólico mais feroz no que diz respeito à negação do Cristianismo - e isso é ainda mais latente quando nos perguntamos quem colocou fogo naquelas cruzes e porque Madonna parece estar tomada de um êxtase pagão ao dançar sensualmente em meio aquela espécie de ritual, com a alça do vestido caindo, o sutiã aparecendo e um pequeno crucifixo no meio dos seus seios. A cena, com uma edição estonteante, é o ápice das simbologias do clipe.

A imagem corta para a cantora, feliz no meio do coral e cercada por crianças sorridentes, sendo "exorcizada" pela mulher negra que apareceu previamente. É um exorcismo de brincadeira, debochando do medo do cristianismo do mal e do profano. Como se não fosse o bastante, a cena é entrecortada por uma Madonna altamente erotizada recebendo um beijo do homem negro que apareceu anteriormente, bem no meio da igreja, rodeada de velas. Nesse devaneio da blasfêmia, seria o amante da cantora o homem acusando injustamente ou o santo? Ou os dois? E o fascínio da cena está na união entre o sagrado e o profano ou na comunhão sexual entre as duas raças? Assim como o fogo das velas que demonstra o fervor religioso é o mesmo fogo que consome os amantes, o clipe alimenta essas ambiguidades, típicas do estilo de Mary Lambert.

Cortes rápidos de cruzes queimando, lágrimas de sangue e a prisão do homem inocente são mostrados enquanto a cantora dançaa feliz no meio do coral e a estátua do santo negro volta ao seu pedestal gradeado. Voltamos então para Madonna, que nesse momento está se levantando do banco de madeira onde havia se deitado no início do clipe, como que acordando de um sonho. Só que, se isto é um sonho, é um sonho que se pensa, e não um sonho que se sonha, pois a igreja é ao mesmo tempo uma delegacia (lugar da ordem, da repressão da liberdade e da sexualidade) e o local onde estava o santo  é o mesmo onde agora está preso o inocente. Desce a cortina vermelha e Madonna é mostrada, desafiadora, novamente no meio das cruzes queimando.

Nesse momento, revela-se o elemento mais genial do clipe: tudo se tratava na verdade de uma morality play, populares principalmente na Inglaterra dos séculos XIV e XV. As morality plays eram, em linhas gerais, alegorias teatrais em que um protagonista se deparava com diferentes questões morais e religiosas representadas por diferentes personagens e assim testava sua fé. O que Madonna e Mary Lambert fazem é pegar o conceito da morality play e subvertê-lo através da ética da sociedade do espetáculo, tornando-a mais um ritual pagão.

Os atores da peça então são apresentados, Madonna e o santo/acusado por último, para dançarem todos felizes no final ao saberem que tudo não passou de uma grande teatralização da realidade, assim como a religião é uma grande teatralização da fé.

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